domingo, 14 de fevereiro de 2016

Que horas ela volta

Ontem assisti "Que horas ela volta". Quando os créditos subiram eu chorava tanto que a amiga que me acompanhou me abraçou tentando me acalmar. Já tinha lido que era praticamente impossível não se identificar com uma das mulheres do filme. Eu me identifiquei com duas: a empregada e a filha. Me identifiquei com Val porque já fui empregada doméstica, mas não foi só desse período que lembrei. Lembrei de todos os sub-empregos que tive. Lembrei da loja de departamentos onde trabalhei como serviços gerais. Minha função era limpar o chão, repor mercadoria e lavar os banheiros, dos funcionários e dos clientes. Mas o que mais me incomodava era ter a bolsa revistada na saída. Trabalhar em um lugar onde eu, uma funcionária, era considerada "suspeita" era extremamente constrangedor.Também lembrei dos tempos de balconista de padaria e do pãozinho de sal que tínhamos direito no lanche. "Somente um pãozinho, e de sal", era a recomendação. Nada de comer iogurtes, bolos ou presunto e queijo. Minha sorte era que Seu Antônio, o confeiteiro, era meu parceiro. Quando me entregava a bandeja com os confeitos, ele me olhava cúmplice e com um movimento na cabeça me apontava os brigadeirinhos e os bolinhos que fazia especialmente pra mim e que eu comia escondido, atrás do balcão. Foi ver Jéssica se deliciando com o pote de sorvete de Fabinho, que me lembrei disso. Também me identifiquei com Jéssica pela curiosidade, por gostar de ler, pelo desejo de estudar e porque, há pouco tempo, também passei a frequentar aeroportos. Me identifiquei também por muitas vezes perceber que a minha presença em muitos lugares incomoda, principalmente na universidade. Ali não é lugar para uma jovem senhora, mãe de filho, que não sabe ler em inglês. O filme também me fez refletir sobre o privilégio que é receber para estudar. O fato de ter sido bolsista no mestrado e no doutorado me permitiu sobreviver, pagar o aluguel, comprar material escolar pro meu filho, além de poder acompanhar seu crescimento, coisa que Val e milhares de mulheres não podem ou não puderam. Graças às mudanças pelas quais passou o país nos últimos anos e que são sensivelmente retratadas no filme, muitas outras Jéssicas puderam voltar para a sala de aula e podem criar seus filhos. Recomento a quem não assistiu, que o faça. Vale muito a pena!

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