segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Amor afrocentrado




Acordei antes do relógio despertar. Chamei o menino. Enquanto ele me contava do sonho estranho, eu preparei o café. Fomos juntos até a esquina, ele seguiu para escola, eu para a caminhada. O sol despontava por sobre as palmeiras da praça. Da nossa rua, a visão era linda, mas não levei a máquina. Paciência, amanhã tem mais. Nos despedimos. Coloquei os fones de ouvido e segui. Não adianta, a trilha sonora perfeita da caminhada é o rap. Vou ouvindo as crônicas urbanas dos Racionais e encontrando os personagens da quebrada pelo caminho. O vira lata que dorme numa gaveta feito cama. Ao lado a água numa panela de pressão amassada e sem cabo. O tiozinho que desce a rua numa bicicleta sem freios e vai reduzindo a velocidade com o pé no chão, o solado da botina já todo desgastado de um lado. Os moleques passando por debaixo da cerca para buscar gravetos no mato para o pai acender o fogão a lenha e fazer o café. O cachorro magricela que vai junto. As casinhas sem reboco, as janelas e portas que esperam uma vida inteira pelo vidro que nunca chega. Pelo cheiro espalhado no ar, hoje o café da manhã é pequi. Mano Brown canta no meu ouvido:
"Preto e dinheiro,
São palavras rivais,
hééé!!!
Então mostra pra esses Cu,
Como é que faz,
(...)
As vezes eu acho,
Que todo preto como eu,
Só qué um terreno no mato,
Só seu,
Sem luxo, descalço, nadar num riacho,
Sem fome,
Pegando as fruta no cacho"
Lembrei da foto que meu sobrinho postou no final do domingo que trazia como legenda, justamente esse trecho da música "Vida Loka parte 2". Ele e a preta dele, numa rede, puro amor afrocentrado.

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