domingo, 2 de agosto de 2015

Cheiros e sons

Baldim é sobretudo cheiros e sons. É o cheiro da fumaça do fogão a lenha, do café ralo coado no coador de pano, do alho socado na hora, do arroz refogado em gordura de porco, da bananinha e da goiabinha cremosas das várias fábricas espalhadas pela cidade. Baldim é também o som das caixas do catopê e da guarda de congo. É a voz do leiloeiro anunciando as prendas a serem arrematadas na quermesse do Asilo de São Vicente de Paulo. É o som do alto-falante da igreja que toca a ave maria, todas as tardes, na hora do ângelus. É também o coro de vozes infantis acordando a cidade para a missa aos domingos, pela manhã. Do mesmo alto falante vem as notas de utilidade pública: o celular perdido, a menina que parou de se alimentar porque o cachorrinho sumiu, o levantamento da demanda para a educação de jovens e adultos na escola estadual. Só um som não  é bom de se ouvir. Quando o alto-falante anuncia o canto "vinde todos os povos da terra para juntos a paz celebrar (...) vinde pobres, entrai rejeitados, aceitai o convite do Pai..." não é um bom sinal.  Depois desse hino, vem sempre a voz firme do Zé da Bilinha anunciando uma "nota de falecimento". A respiração fica suspensa até ouvirmos o nome do falecido e sabermos se é ou não alguém da nossa rede de afetos.

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