terça-feira, 20 de junho de 2017

Janela azul de tramela

Fico tentando compreender o fascínio que essa janela azul de tramela exerce sobre mim. O que será? É uma janela velha com sua madeira gasta pelo tempo. As marcas do facão onde mamãe partia a costelinha de porco para o mingau de couve ainda estão lá. Será por isso? Era lá também, que depois de cumprida as obrigações com a casa, mamãe se debruçava com as mãos no queixo a pensar na vida e nos seus projetos. Porque mamãe sempre foi uma mulher de projetos. Não só de planejar, mas de executar. Terminava um, ela criava outro. Será por isso? Vejo uma parte do muro, sonho antigo da mamãe, que substituiu a cerca que por muitos anos esteve ali. Nem lembro mais como era antes dele. Mamãe nunca quis um muro alto, pois gostava de ver o movimento da rua. Vejo também parte do telhado da casa da Dona Maria do Heitor, que não é mais dela, mas que será pra sempre dela. Parte da copa de um pé de laranja e de jabuticaba. Parte da carroceria do caminhão do meu irmão já incorporado à paisagem. E o morro... O mesmo morro que me encantava na infância, quando deitada no chão frio de cimento vermelho, no alpendre da casa do vovô eu me recuperava da tensão ao ler "O médico e o monstro". O vento no capim meloso provocava um balé que parecia centenas de bichinhos felpudos descendo correndo morro abaixo. Vejo ainda algumas folhas do pé de mamão que já alcança o telhado, mas segue em produção, cobiçando quem passa pela rua. Há ainda, os fios da energia elétrica onde no final de tarde os pardais dançam pra mim. E o bebedouro dos beija-flores disputado com muita briga entre eles. Ah, e tem o céu, que hoje está cheio de nuvens brancas. É só isso! Nada demais. Tudo tão banal, mas que me fascina tanto... Por que será?

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