quarta-feira, 10 de agosto de 2016

O mundo dá voltas

Apressei o passo para aproveitar o sinal aberto para pedestres e me enfiei no meio dos estudantes. Lembrei do meu primeiro dia como aluna da UFMG. Naquele início de março de 1991, eu seguia em direção à FAFICH, ainda meio incrédula e ia pensando: "eu passei no vestibular. vou estudar na UFMG!" E uma alegriazinha tomava conta de mim. Duas outras irmãs, uma mais velha e outra mais nova que eu, formariam naquele ano. A UFMG foi meu segundo choque cultural. O primeiro foi o contato com a metrópole, depois de mudar de uma cidadezinha de 7 mil habitantes.
Ontem, enquanto caminhava em direção à FaE, ia lembrando do tanto que circulei por aquele campus. Sempre correndo pra lá e pra cá, pois tinha que estudar e trabalhar.
Nos fones de ouvido, Jaloo cantava "Last Dance" pra mim, mas senti que o momento pedia algo mais forte e selecionei "Mandume", do Emicida. Primeiro o refrão:
"Eles querem que alguém
Que vem de onde nóiz vem
Seja mais humilde, baixa a cabeça
Nunca revide, finge que esqueceu a coisa toda
Eu quero é que eles se fodas!"
Depois, Drik Barbosa, uma das muitas rappers pretas empoderadas dos últimos tempos, continuou:
"Sou Tempestade, mas entrei na mente tipo Jean Grey
"Xinguei,
quem diz que mina não pode ser sensei?
Jinguei,
sim sei, desde a Santa Cruz, playboys
Deixei em choque, tipo Racionais, "Hey Boy! "
Tanta ofensa, luta intensa nega a minha presença
Chega!
Sou voz das nega que integra resistência
Truta rima a conduta, surta, escuta, vai vendo
Tempo das mulher fruta, eu vim menina veneno
Sistema é faia, gasta, arrasta Cláudia que não raia
Basta de Globeleza, firmeza? Mó faia!
Rima pesada basta, eu falo memo, igual Tim Maia
Devasta esses otário, tipo calendário Maia
Feminismo das preta bate forte, mó treta
Tanto que hoje cês vão sair com medo de buceta
Drik Barbosa, não se esqueça
Se os outros é de tirar o chapéu, nóiz é de arrancar cabeça."
Mandume é para mim, uma das músicas mais fodas de 2016.
Quando atravessei a porta da Faculdade de Educação, pensei que era chegada a hora de solucionar um caso de amor mal resolvido. Tentei por 3 anos consecutivos passar no mestrado na FaE e fui reprovada nas três tentativas. Cheguei a tirar 100 na prova de línguas e 98 na prova escrita e ser reprovada na entrevista. Amarguei essa frustração por quase 10 anos. Mas, agora eu voltava, não como aluna, mas como professora. Preciso confessar que sentir uma satisfaçãozinha com um certo gosto de revanche. hahaha
Mas o desafio é gigante! Substituir um professor referência em educação, estudioso das juventudes, além de ser um ser humano incrível. Enquanto andava com ele pelo departamento, ia observando como ele trata as pessoas. Pessoa mais amorosa e gentil nunca vi. Trata a tiazinha da limpeza com o mesmo carinho e atenção que o colega doutor.
E a turma? Que turma é aquela? O corpo não consegue aprisionar o sentimento e eu vi nos olhinhos delxs a tristeza com a saída do professor foduço que elxs têm, mas uma alegria contida com a novidade da minha chegada. Uma aluna, inclusive, falou da minha presença ali, e de quanto este fato significava representatividade. Eu me emocionei muito com a recepção dxs meninxs. Cada fala mais fofa que a outra.
Fiquei observando como a Universidade está muito mais preta do que na minha época de graduação. Na verdade ela está muito mais diversa, mais colorida, mais inclusiva. E os alunx apreensivos com o que estar por vir.
Enquanto lia os trabalhos delxs ia percebendo a importância de programas como o Ciência sem Fronteira, o PIBID, entre outros. Todos comentavam da importância do intercâmbio, do tanto que abriu a cabeça delxs, e do desejo de enfrentar uma sala de aula, nascido depois de viverem a experiência do PIBID.
O Brasil não merece o golpe que está se consolidando. Como li por aí, ontem, será que vamos assistir a tudo bestializados, atônitos como escreveu José Murilo de Carvalho a respeito da proclamação da república?

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