segunda-feira, 11 de julho de 2016

Uma experiência ética, estética e política

Foto: Jornal O Tempo no Facebook

Criolo subiu ao palco vestido de bermuda e moletom do "Laboratório Fantasma", marca do amigo e rapper, Emicida. Suas roupas são sempre um depoimento. Apesar de, geralmente, vestir-se de maneira despojada, as camisetas parecem ser escolhidas "à dedo" para cada ocasião. Seja a retrô do Corinthians-Democracia, exibida durante o show da "Virada" em SP, seja a camiseta "convoque seu buda" com o pixo em homenagem ao Goma, que apareceu, algumas músicas depois, quando ele retirou o casaco.

 Foto: capturada no perfil "Pixo Livre" no Facebook

Goma é um pixador belo horizontino que está preso por crime ambiental e formação de quadrilha. "Prender pixador é fácil, quero ver prender o presidente da Samarco", dizem os pixos pela cidade. "+Goma - Cunha", diz outro. DJ DanDan também colou, em sua blusa amarrada na cintura, uma cartazinho "Temer Jamais" que foi exibido durante todo o show. Criolo e DanDan também abriram uma faixa do "Movimento de Mulheres Olga Benário" dizendo não à cultura do estupro. Nesse momento, uma menina que estava ao nosso lado, caiu no choro. Show do Criolo é assim: é sempre uma experiência política.

Foto: capturada no perfil "Movimento de mulheres Olga Benário" no Facebook.

Durante todo o show, Criolo também "pregou" o amor, a paz, a tolerância. Seu discurso é sempre articulado, dando a impressão que ele nunca fala sem pensar. Ele sabe que é formador de opinião e que tem uma geração de adolescentes, em formação, que curte o seu som, se identificam com suas letras. Ele, inclusive, brincou que está ficando velho, virando um "tiozinho". Em sua fala está sempre presente referências à mãe, Dona Vilani e ao pai, Seo Cleon. O rapper sempre "prega o respeito aos pais, a família como um valor. Show do Criolo é assim: é sempre uma experiência ética.

O show foi uma grande celebração. É impressionante a diversidade de público que Criolo alcança. Já fui em outros shows dele, mas esse tinha uma característica especial, tinha negros, muitos negros. A quebrada colou, em peso, na Praça da Estação.

Criolo no palco parecia o "cavalo" de algum deus da música. E quando a voz de Juçara Marcal cantou "Fio de Prumo (Padê Onã)":
"Laroyê bará
Abra o caminho dos passos
Abra o caminho do olhar
Abra caminho tranquilo pra eu passar
Laroyê eleguá
Tomba o mal de joelhos
Só levantando o ogó
Dobra a força dos braços que eu vou só
Laroyê legbá
Guarda ilê, onã, orum
Coba xirê deste funfum
Cuida de mim que eu vou pra te saudar
Que eu vou pra te saudar." Criolo dançava como se estivesse numa gira para os Orixás.
 

Quando ele cantou "Grajauex", a multidão enlouqueceu. A quebrada é como o sertão de Guimarães Rosa, está em toda parte, está dentro da gente. E, quando ele canta, é como se estivesse falando da Pedreira Prado Lopes, do Aglomerado da Serra ou de qualquer outra favela do mundo. "Toda rua é principal, toda avenida é principal", ele disse para delírio da plateia.

Em certo momento, ele saiu do palco e o DJ Marco sampleou trechos dos MC's das antigas, referências de Criolo. Racionais foi um deles. O sample "o colarinho branco dá o golpe no estado" de Duck Jam e Nação Hip Hop foi repetido várias vezes, levando a multidão a levantar seus cartazes e gritar "Fora Temer".

 Foto: Jornal O Tempo no Facebook

Criolo se divertiu, brincou, falou sério, se indignou, se emocionou. Show de Criolo é assim: é sempre uma experiência estética.

O show terminou, fomos embora pra casa, mas durante dias, ainda ficamos assim, fruindo a beleza. O escritor Bartolomeu Campos de Queiroz diz que a beleza sozinha pesa, que por isso precisamos dividir com alguém. Ainda bem que existem os shows para os artistas dividirem beleza com a gente.

 Foto: Jornal O Tempo no Facebook

Show do Criolo é assim: é sempre uma experiência ética, estética e política.

Gratidão, Criolo!

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