sábado, 7 de maio de 2016

Fechado para almoço

Estou com medo. Como Neo, no filme Matrix, meu sentimento é que estou diante de Morpheus, o deus do sono, que me estende as mãos com as duas pílulas: a azul que me permite continuar iludido; ou a vermelha, que me abrirá os olhos para conhecer a verdade do que está por trás desse mundo que, de repente, se descortinou aos nossos olhos. Quero uma consulta com o oráculo para me orientar, mulher de pouca fé, que sou. Daí, lembro do escritor do Capão Redondo, Ferréz e de seu livro que não me sai da cabeça, "Deus foi almoçar". O romance narra a história de um homem que se vê sozinho, desamparado, depois da separação da mulher e filha. Ferréz disse que quando teve a ideia para o livro, imaginou Deus como um comerciante que fechou as portas do seu estabelecimento para almoçar. Portanto, não adianta pedir, porque ele está em horário de almoço e a hora do alimento, como sabemos, é sagrada. Daí, eu lembro de outro livro que também tem me perseguido  nesses dias: "O evangelho segundo Jesus Cristo", de Saramago, na cena emblemática do diálogo entre Deus e o Diabo:

"Diabo: Não me aceitas, não me perdoas?

Deus: Não te aceito, não te perdoo, quero-te como és, e, se possível, ainda pior do que és agora.

Diabo: Porquê?

Deus: Porque este Bem que eu sou não existiria sem esse Mal que tu és, um Bem que tivesse que existir sem ti seria inconcebível, a um tal ponto que nem eu posso imaginá-lo, enfim, se tu acabas, eu acabo, para que eu seja o Bem, é necessário que tu continues a ser o Mal, se o Diabo não vive como Diabo, Deus não vive como Deus, a morte de um seria a morte do outro."

É isso! Noiz por noiz! Deus foi almoçar. Estamos sem oráculo para nos orientar, sem Morpheu para nos fornecer as pílulas. Estamos desamparados como o arquivista Calixto, de Ferréz, com o mal à solta. Por outro lado, estar desiludido tem seu lado bom. É sinal de que você perdeu as ilusões. Mas, quando retorna o expediente nessa bagaça? Alguém sabe informar? Ou esse horário de almoço vai durar pra sempre? Enquanto deus almoça, o golpe tá rolando..."

4 de maio

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