terça-feira, 15 de novembro de 2016

Quando a coisa fica preta, a coisa fica boa

O domingo amanheceu com uma chuvinha fina, daquelas de engrossar rio, de fazer o milho crescer. Hora de fazer a mochila e aproveitar o feriado para voltar pra casa tratar das 'criação'.
A semana foi intensa! A metrópole proporciona isso. Depois desses anos de reclusão em Baldim, estamos sedentos por programações culturais e BH não faz feio, não.
Na segunda teve sarau com participação de Renegado e Tom Nascimento, que fizeram toda a diferença. Quando a coisa fica preta, a coisa, realmente, fica boa.
Na terça, teve roda de conversa com a professora e ex-ministra Nilma Lino Gomes, a primeira mulher negra a ser reitora de uma universidade (Unilab). Nilma falou sobre racismo, relações raciais e educação para uma platéia que encheu a Ocupa FaE de cor. Que coisa linda, xs pretxs todxs querendo se expressar. Nilma falou que não tem como discutir racismo sem pensar os privilégios da branquitude. Falou também do movimento negro e dxs negrxs em movimento. Foi ovacionada! Representatividade importa! Nossxs corpos negros precisam estar ocupando a universidade, trazendo à tona a necessidade de refletirmos sobre os silêncios e a invisibilidade de certas pautas.
Na quarta, o menino se sentindo culpado porque mataria aula, veio de Baldim para participar da conversa com o músico Emicida e o escritor Ferréz. Fomos cedo para a porta do teatro pegar os ingressos e na fila já tínha um monte de mina preta discutindo empoderamento negro. Não resisti, me meti na conversa e viramos amigas de infância. O grande teatro do Sesc Palladium ficou lotado, mais uma vez, por uma platéia cheia de cor. Os corpos negros precisam ocupar também os espaços da cultura. Eram muitos blacks e turbantes empoderados colorindo aquele teatro. Foi lindo, foi forte, foi empoderador. Mais uma vez, as vozes desses sujeitos à margem queriam ser ouvidas. Não sem razão, o tema da conversa era literatura periférica. Os sujeitos periféricos na condição não mais de objeto de estudo, mas como protagonistas, como sujeitos de uma produção artísitica importante, não só simbolicamente, como também histórica e politicamente. Foram 3 horas de conversa que só foi interrompida porque o teatro precisava ser fechado. Não dá mais para ignorar a produção cultural e artísitica desses sujeitos periféricos. A periferia sendo discutida não como lugar de pobreza e violência, mas como um espaço de potência cultural.
Na quinta, o menino viveu pela primeira vez a experiência de um corte de cabelo num salão afro. Todx pretrx precisa viver isso. Eu fiquei ali, sentada admirando aquele black lindo que era elogiado por cada pretx que entrava no salão. O menino sempre alimentou o desejo de deixar o cabelo crescer, mas só consegui, há cerca de 2 anos, depois de participar de um evento onde havia muitos blacks, dreads e crespos lindos. Depois daquele evento ele nunca mais cortou o cabelo e foi a primeira vez que aparou as pontinhas. Mesmo assim, só se sentiu seguro com um cabelereiro negro. Enquanto ficava ali, assistindo, ouvi muitas histórias sobre bailes, festas, enquadros de polícia e racismo.
Na sexta, a aula foi na rua. Levei o menino para a manifestação contra a Pec 241/55. Foi lindo ver seu olho brilhando ao observar xs meninxs do Levante da Juventude. Estudante se juntando com professor e funcionários da educação para manifestarem sua indignação contra a Pec da Morte. Tenho certeza que o que ele aprendeu numa manhã na manifestação, ele não aprenderia em um semestre de escola.
Ontem, foi a vez de uma conversa com congadeiros e fazedores de cultura da região metropolitana de BH. Novamente, foi lindo, foi forte, foi empoderador. A conversa girou em torno da necessidade de nossos corpos negros ocuparem também, os espaços da política.
A cada dia que passa, eu fico mais convencida que, independente ou a contrapelo do golpe, existe uma revolução em curso, e que embora invisibilizada segue a pleno vapor e passa pelxs estudantes, pelas mulheres, pelos LGBT's e pelo povo preto.

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