quinta-feira, 23 de abril de 2015

Mais uma carta perto do coração


Gabina, amiga querida!

Acabo de despachar João para a escola e o Scooby já suspira aos meus pés. Você já ouviu o suspiro de um cachorro? É uma coisa impressionante. Se eu soubesse, faria um poema sobre isso. É algo entre melancólico e triste.

Que coisa linda a sua carta/resposta. Adoro o seu português mestiço, me soa extremamente poético.Penso que você não deveria fazer revisão da sua tese. Sua fala parece a de uma personagem saída das novelas de Guimarães Rosa. Aquela figura bem específica, mas que ao mesmo tempo é atemporal e universal. Por que não sou escritora? Se fosse, escreveria um romance com uma protagonista inspirada em você. Será que um dia eu consigo?

Olha, essa história da arruda murchar é coisa séria, viu? Outro dia, uma conhecida esteve aqui e me falou que depois que ela deixou uma vizinha apanhar o fruto, o pé de chuchu nunca mais produziu. Segundo ela, "quando o coração não é bom, o olho é ruim e até a mão não presta." Por isso, faz todo sentido o seu ciúme com o jardim. Você já ouviu falar em  radiestesia? Uma vez assisti uma reportagem mostrando como se localiza água usando uma forquilha. Fiquei muito impressionada e passei a acreditar em energia. Por isso eu assumo logo quando estou invejando alguém. Dizem que quando você assume, a inveja perde a negatividade. Eu tenho muita inveja de você, Gabina. Você é tão inteligente! E ainda por cima é linda, fala inglês, sabe nadar, canta super bem, fica de ponta cabeça naquelas posições de ioga e agora, ainda toca um instrumento.  Assumo logo a minha inveja para ela perder a energia ruim e chegar até você, só o amor que sinto, que é imenso. Chega a me dar vontade de chorar.

Você fala da chuva e do frio chegando por aí. Aqui, choveu durante a noite, mas amanheceu com o céu azul e o sol visível. Chove pouco por aqui e praticamente não faz frio, afinal estamos localizados bem na região centro-norte do estado, porta de entrada do sertão.

Bom, vou ali acender duas velas para me inspirar com a escrita. Uma é para Santa Clarice Lispector e a outra, para São João Guimarães Rosa, santos de minha devoção. Peço a eles que me ajudem  a comer minha barata e a me livrar da terceira perna. Descobri que essa tarefa tem que ser diária. Não é assim, comeu, cortou e ficou livre. Não! Se você ficar fazendo muita hora, a barata se regenera, mesmo depois de morta, e aí, temos que começar tudo de novo. E é a mesma coisa com a terceira perna; você corta, mas se não tomar cuidado, nasce outra rapidinho... Aí, ficamos, de novo, equilibrados como um tripé, mas presos ao chão.

Vou trabalhar! Beijo grande em você. Lembranças ao Davi.

Me escreva, Gabina... Me escreva...

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